TRFs da 2ª e 3ª Regiões decidem pela exclusão do PIS e da COFINS de suas próprias bases de cálculo

TRFs DA 2ª e 3ª REGIÕES DECIDEM PELA EXCLUSÃO DO PIS E DA COFINS DE SUAS PRÓPRIAS BASES DE CÁLCULO

Janir Adir Moreira e Alessandra Camargos Moreira

Advogados Tributaristas

     Desde que o STF julgou o “Leading Case”, com repercussão geral reconhecida (Tema 69), representado pelo RE-574.706, definindo pela não inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, ocorreu uma avalanche de ações de contribuintes submetendo as chamadas “teses filhotes” ao Poder Judiciário.

     Uma delas diz respeito à exclusão do PIS e da COFINS de sua própria base de cálculo, que por sua vez também teve a repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (Tema 1.067), dado à sua similaridade jurídica com o Tema 69, qual seja a abrangência constitucional do conceito de “receita bruta” e “faturamento”.  Ressalte-se, contudo, que a maioria dos Tribunais Regionais Federais vinha decidindo de forma contrária às teses defendidas pelos contribuintes.

     Em Dezembro/2019, todavia, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região deu uma reviravolta na jurisprudência até então dominante e proferiu uma decisão favorável aos contribuintes (Autos nº 5022842-67.2018.4.03.6100, sob a relatoria do Desembargador ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 19/12/2019, Intimação via sistema em 20/01/2020).), estando o acórdão assim ementado:

“TRIBUTÁRIO E PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. EXCLUSÃO DO PIS E DA COFINS DA BASE DE CÁLCULO DAS PRÓPRIAS CONTRIBUIÇÕES. SENTENÇA QUE CONCEDEU A ORDEM. REMESSA OFICIAL E APELO DA UNIÃO DESPROVIDOS.

– Recurso Extraordinário n. 574706. Repercussão geral reconhecida. Os valores arrecadados a título de ICMS não são incorporados ao patrimônio do contribuinte e, dessa forma, não podem integrar a base de cálculo do PIS e da COFINS, uma vez que a arrecadação daquele imposto constitui tão somente ingresso de caixa ou trânsito contábil a ser totalmente repassado ao fisco estadual e, assim, não representa faturamento ou receita. Destarte, razoável que se aplique o mesmo raciocínio ao presente caso, haja vista a identidade de fundamentos e especialmente porque tributos não devem realmente integrar a base de cálculo de outros tributos. Quanto a essa matéria, saliente-se que não afasta o presente entendimento o fato de o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 582461, ter concluído no sentido de ser constitucional a inclusão do valor do ICMS na sua própria base de cálculo, uma vez que, ao contrário do que acontece com as contribuições ao PIS e a COFINS, há autorização expressa no texto da Carta Magna de 1988.

– Ao se entender que o quantum pago a título de PIS e de COFINS (destacados em nota fiscal) integre o valor total da nota, em realidade admite-se que essas contribuições fazem parte do faturamento da pessoa jurídica, o que viola o princípio da capacidade contributiva, segundo o qual os particulares devem contribuir conforme a sua capacidade econômica e não de acordo com valores que sequer fazem parte de seu faturamento, considerado que serão repassados compulsoriamente ao fisco.

– Lei n. 12.973/14. Com relação à Lei n. 12.973/14, especificamente no que concerne às contribuições para o PIS e à COFINS, tal diploma normativo apenas manteve a expressão total das receitas auferidas (artigos 54 e 55 – para a sistemática da não cumulatividade), bem como especificou as receitas compreendidas na definição de receita bruta (artigo 2º, o qual alterou o artigo 12 do Decreto-Lei n. 1.598/77 – para a sistemática da cumulatividade). No entanto, apesar de a mencionada lei incluir o § 5º ao artigo 12 deste decreto-lei, entendo que o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do RE n. 574.706 encerrou tal discussão ao considerar expressamente neste julgado as alterações concernentes ao tema trazidas pela Lei 12.973/2014. Portanto, em respeito ao ordenamento jurídico brasileiro, se a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS foi declarada inconstitucional de forma legítima e pelo órgão competente para tanto, descabido o pleito da apelante no que toca a essa análise, conforme se comprova ao se analisar o inteiro teor do acórdão citado.

– Receita líquida. Receita bruta diminuída dos valores relativos a devoluções e vendas canceladas, descontos concedidos incondicionalmente, tributos sobre ela incidentes e valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações vinculadas à receita bruta. Em outras palavras, apenas no cálculo da receita líquida é que foi expressamente mencionada a hipótese de desconto de tributos sobre ela incidentes. Porém, o fato de a técnica legislativa ter-se valido da exclusão de tributos somente ao se referir à receita líquida (artigo 12, § 1º, do Decreto-Lei n. 1598/77) não significa automaticamente que esses devam ser incluídos na receita bruta (artigo 12, caput, do Decreto-Lei n. 1598/77), uma vez que, se assim fosse, estar-se-ia diante de um raciocínio interpretativo tão somente dedutivo, porém em relação a algo que somente por lei poderia ser estabelecido, qual seja, a especificação da base de cálculo de um tributo, nos termos do princípio da legalidade (artigo 150, inciso I, da CF/88) e do artigo 44 do CTN. Por fim, cumpre ressaltar que os valores de ICMS, nos moldes do que consta no artigo 13, §1º, da LC n. 87/96, permitem destaque na respectiva nota fiscal, no que se conclui jamais poderem integrar o preço da mercadoria ou da prestação do serviço para fins de cálculo da receita bruta do contribuinte.

– Entendimento do Supremo no julgamento do RE n. 582461. Quanto à questão, saliente-se que não afasta o presente entendimento o fato de o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do RE n. 582.461, ter concluído no sentido de ser constitucional a inclusão do valor do ICMS na sua própria base de cálculo, uma vez que, ao contrário do que acontece com as contribuições ao PIS e a COFINS, há autorização expressa no texto da Carta Magna de 1988 a esse respeito.

– Prazo prescricional na repetição de indébito de tributos sujeitos à homologação. A questão relativa à contagem de prazo prescricional dos tributos sujeitos a lançamento por homologação foi analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, à vista do Recurso Especial nº 1.269.570/MG, julgado recentemente, em 23.05.2012, e seguiu o entendimento que foi definido no Recurso Extraordinário nº 566.621/RS pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a repetição ou compensação de indébitos pode ser realizada em até dez anos contados do fato gerador somente para as ações ajuizadas até 09.06.2005. Por outro lado, foi considerada: “válida a aplicação do novo prazo de 5 anos tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9 de junho de 2005”. O artigo 3º da Lei Complementar nº 118/2005 deve ser aplicado às ações ajuizadas a partir de 09/06/2005. No caso dos autos, verifica-se que o mandamus foi impetrado em 10.09.2018 (Id. 67395155). Aplicável, portanto, o prazo prescricional quinquenal.

– Necessidade de comprovação do recolhimento em sede de mandado de segurança para fins de compensação. No que tange à pessoa jurídica, a questão da comprovação para fins de compensação tributária no âmbito do mandado de segurança foi objeto de nova análise pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (no julgamento do Resp 1.365.095/SP e do Resp 1.715.256/SP, apreciados sob a sistemática dos recursos repetitivos), que concluiu que basta a demonstração da qualidade de contribuinte em relação ao tributo alegadamente pago de forma indevida. Dessa forma, os valores efetivamente a serem compensados somente serão apurados na seara administrativa, momento em que devem ser apresentados todos os documentos pertinentes ao recolhimento a maior. Em outras palavras, para o deferimento do pleito compensatório requerido judicialmente não se faz imprescindível a juntada das guias de pagamento, necessárias apenas no momento em que se for efetivar a compensação perante o fisco. Assim, considerado o período quinquenal a ser compensado, deverá ser deferida a compensação nesta sede pleiteada, porquanto comprovado o direito líquido e certo necessário para a concessão da ordem no presente remédio constitucional.

– Compensação de valores indevidamente recolhidos. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça exarado no Recurso Especial n.º 1.137.738/SP, representativo da controvérsia, submetido ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil, no tocante à compensação deve ser aplicada a lei vigente à época da propositura da demanda. In casu, deve ser aplicada a Lei nº 10.637/2002, com as limitações previstas na Lei nº 11.457/2007, ambas vigentes à época da propositura da demanda. Nesse ponto, cumpre registrar que a Lei n. 13.670/18 incluiu o artigo 26-A à Lei n. 11.457/07, a permitir que o sujeito passivo que apure crédito tributário possa utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal, à exceção das contribuições das contribuições previdenciárias pelo contribuinte que não utilizar o eSocial (quanto a essa questão, já foi inclusive editada uma instrução normativa pela Receita Federal, qual seja, a IN 1.810/18). Seguem as disposições normativas mencionadas. Quanto ao artigo 170-A do Código Tributário Nacional, a matéria foi decidida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Recursos Especiais n.º 1.164.452/MG e n.º 1.167.039/DF representativos da controvérsia, que foram submetidos ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil e regulamentado pela Resolução n.º 8/STJ de 07.08.2008, no qual fixou a orientação no sentido de que essa norma deve ser aplicada tão somente às demandas propostas após sua entrada em vigor, que se deu com a Lei Complementar n.º 104/2001, mesmo na hipótese de o tributo apresentar vício de constitucionalidade reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. A ação foi proposta em 2018, após a entrada em vigor da LC nº 104/2001, razão pela qual incide o disposto no artigo 170-A do Código Tributário Nacional.

– Correção monetária do indébito. Quanto à correção monetária, saliento que se trata de mecanismo de recomposição da desvalorização da moeda que visa a preservar o poder aquisitivo original. Dessa forma, ela é devida nas ações de repetição de indébito tributário e deve ser efetuada com base no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013 do Conselho da Justiça Federal. Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. No que se refere aos juros de mora, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no Recurso Especial n.º 1.111.175/SP, representativo da controvérsia, submetido ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil, no sentido de que nas hipóteses em que a decisão ainda não transitou em julgado, como é o caso dos autos, incide apenas a taxa SELIC, que embute em seu cálculo juros e correção monetária (REsp 1.111.175/SP, Primeira Seção, rel. Min. Denise Arruda, j. 10.06.2009, DJe 01.07.2009).

– A matéria referente aos artigos 1o e 7o da LC n. 07/70, artigo 2o da Lei n. 9.715/98, artigos 1o e 2o da LC n. 70/91, artigos 2o e 3o da Lei n. 9.718/98, artigos 1o das Leis n. 10.637/02 e n. 10.833/03, artigo 208 do RIR/2018, artigos 109, 111 e 176 do CTN, artigos 3o, inciso I, 150, inciso I, e § 6o, 194 e 195 da CF/88 e artigo 187 da Lei n. 6.404/76, citados pela fazenda em seu recurso, não tem o condão de alterar o presente entendimento pelas razões explicitadas anteriormente.

– Negado provimento à remessa oficial, bem como igualmente ao apelo da União. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApReeNec – APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO – 5022842-67.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 19/12/2019, Intimação via sistema DATA: 20/01/2020).”

     Destacamos que segundo os argumentos do voto do relator, uma questão que vinha representando o principal argumento dos vários julgados contrários à tese dos contribuintes em que o STF ao julgar os RE 212.209 e 582.461 decidiu pela constitucionalidade da inclusão do valor do ICMS sobre a sua própria base de cálculo, não seria aplicada a esse caso, uma vez que no caso específico do ICMS a própria Constituição Federal de 1988 traz disposição expressa no sentido da atribuição de sua regulação por Lei Complementar e a LC 87/1996 dispõe em seu art. 13, § 1º, I, que “integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo: I - o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle.”      A grande diferença é que em relação às contribuições para o PIS e COFINS não há disposição semelhante na Constituição Federal e nem tampouco em Lei Complementar.   Segundo o relator a exigência provoca o desvirtuamento do conceito de “faturamento” e “receita bruta” constantes dos arts. 195 e 239 da CF/88, bases de cálculo do PIS e da COFINS e, consequentemente, o indevido alargamento da base tributável sem qualquer amparo na Carta Magna.

     Não se pode perder de vistas que o STF já se debruçou sobre questão jurídica semelhante quando, no RE nº 559.937/RS (com repercussão geral reconhecida),  julgou pela inconstitucionalidade da inclusão do “PIS/COFINS - Importação” sobre as próprias bases de cálculo prevista na Lei nº 10.865/2004, por estar em rota de colisão frontal com a Constituição Federal de 1988.

     Registre-se que o TRF3, em diversas oportunidades já havia julgado pela constitucionalidade da incidência do PIS e da COFINS sobre as suas próprias bases de cálculo, afastando a aplicação analógica do entendimento firmado pelo STF no acórdão 574.706, que definiu a Tese 69 da repercussão geral no sentido de que o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da COFINS.

     Em recentíssimo julgado (23/09/2020), a 1ª Turma do TRF da 3ª Região, também por unanimidade, decidiu pela concessão de Liminar em Agravo de Instrumento manejado no processo nº 5003556-02.2020.4.03.0000, assegurando à Impetrante o direito à exclusão do PIS e da COFINS de suas próprias bases de cálculo.

   Também o TRF2 (Rio de Janeiro), através da 3ª Turma Especializada, ao julgar os processos nº Autos nº 5000953-83.2019.4.02.5119 e 5015731-61.2019.4.02.5118), por maioria, alterou a sua jurisprudência e julgou pela inconstitucionalidade da inclusão do PIS e da COFINS de suas próprias bases de cálculo, uma vez que impostos e contribuições não integram o patrimônio do contribuinte, em nada se distanciando do entendimento do STF ao julgar o RE nº 574.706 (Tema 69) e o RE nº 559.937/RS (Tema 001).

     Esclarecemos ainda que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral na discussão sobre  a questão da inclusão da COFINS e do PIS em suas próprias bases de cálculo, (Tema 1067, RE nº1233096, em 17/10/2019), sendo que não houve a determinação de suspensão da tramitação dos processos nos vários tribunais e o processo representativo da repercussão geral ainda não foi incluído em pauta do STF.

     Finalmente, não é demais reconhecer que o novo entendimento jurisprudencial inaugurado com a decisão da 4ª Turma TRF3 em dezembro de 2019 e reafirmado em setembro e outubro de 2020 pela 3ª Turma do TRF2 e 1ª Turma doTRF3 representam uma reviravolta nos posicionamentos até então assumidos e que podem influenciar os julgamentos futuros dos demais TRFs (até agora contrários à tese dos contribuintes), com possibilidades jurídicas de julgamento do STF pelo afastamento da incidência do PIS e da COFINS sobre as suas próprias bases de cálculo.

     As decisões mencionadas afastam a incidência das contribuições do PIS e da COFINS sobre as suas próprias bases de cálculo em relação aos fatos geradores futuros e asseguram aos impetrantes a compensação do que foi recolhido sobre tais parcelas nos cinco anos que antecedem aos respectivos ajuizamentos das ações, sendo que as compensações serão processadas após os respectivos trânsitos em julgado.               

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